quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Acolhida aos novos professores

A recepção pode virar uma decepção

A maneira de a escola acolher os novos professores revela como ela encara sua função social e se leva a sério seu projeto educativo

Luis Carlos de Menezes (gestao@atleitor.com.br)
LUIS CARLOS DE MENEZES  "Ao apresentar condições de atuação, problemas e propósitos, uma escola está envolvendo e formando educadores."  Foto: Marcos Rosa
Nunca se falou tanto em formação continuada de professores. Os motivos são a péssima qualidade da graduação e a consciência de que há diversas dimensões da prática só completadas no exercício da profissão. No entanto, é pouco mencionado o valor da iniciação dos educadores que acabaram de deixar a universidade, que tanto podem ser bem recepcionados em certas escolas quanto correr o risco da (de) formação ao serem decepcionados e desestimulados em outras. Reportagem de NOVA ESCOLA de outubro de 2008 sobre formação lembra a importância desse batismo.
Conheço um professor de Arte que foi recebido no primeiro dia de trabalho por colegas que desqualificaram os estudantes e também ridicularizaram a rapidez dele em atender ao sinal para a aula. "Você deveria ter pressa é de ver a aula acabar", disseram ao jovem, que ao entrar na classe lamentou a escolha pela carreira, desamparado diante de uma turma de crianças se estapeando. No entanto, sei também de uma professora de Geografia, recém-chegada a um município, acolhida por colegas com informações sobre os problemas da série para a qual lecionaria. Eles a orientaram a usar um texto didático regional de complementos de História e Geografia para dar contexto local a questões ambientais, sociais e econômicas de sua disciplina.
Ambos os casos se deram em escolas do Ensino Fundamental com orçamentos, instalações e equipes equivalentes em termos de formação inicial e salários e que, por isso, poderiam ter qualidade comparável. Mas nada é por acaso nesse primeiro dia da carreira de um mestre, pois as experiências descritas também refletem a forma de planejar e avaliar o ensino e de se relacionar com a comunidade e, portanto, resultam em diferença no desenvolvimento de crianças e jovens. Enfim, tudo na escola é pedagógico, tanto para os que nela estudam como para os que ali começam a atuar.
A essa preocupação se junta outra, a da rotatividade. Esse mal, comum em muitas redes públicas, faz com que as escolas sofram com a frágil relação de pertencimento dos docentes, o que compromete a identidade da equipe. Uma situação assim exige particular cuidado da coordenação pedagógica para garantir continuidade, já que o acidental e intenso fluxo de novos educadores - entre eles os iniciantes - não pode ser tratado com a mesma naturalidade do rotineiro fluxo de novos alunos.
A cada começo de ano, vale a pena organizar uma recepção em que se descrevam conquistas ou pendências do período anterior, se enumerem os recursos disponíveis e se proponham desafios e metas. Idealmente, isso seria feito junto com o conselho de escola, com representantes de famílias e de estudantes, conforme o caso, mas sempre com atenção específica aos que acabaram de chegar.
Ao apresentar condições de atuação, problemas e propósitos, uma escola está envolvendo e formando educadores, mais do que simplesmente reunindo gente para dar aulas. Isso é verdade também para quem já é experiente – novato somente na escola. Para uma melhor dimensão da importância desse ritual basta comparar um grupo de educadores a um conjunto de artistas ou de esportistas. Se uma orquestra recebe novos músicos ou se a um time de futebol profissional são integrados atletas da categoria juvenil, a ambientação dos principiantes é tão importante para eles quanto será para o desempenho coletivo. Imagine, porém, se o maestro dissesse: “Senta aí e vai tocando”. E o técnico: “Entra aí e vai jogando”. Impensável, concorda? Do mesmo modo que situações como essas seriam inconcebíveis na escola – mas, infelizmente, acontecem.
Luis Carlos de Menezes (pensenisso@abril.com.br)
Físico e educador da Universidade de São Paulo

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